Barracão Cultural

O bairro de Água Fria, zona norte da cidade de Recife, nasceu de uma das localidades mais antigas do Recife, Beberibe, e destaca-se pelos aspectos religiosos dos tradicionais terreiros de Candomblé, denominado de Xangô em Pernambuco, assim como as instituições ligadas a cultura afro. No caso do bairro de Água Fria e bairros adjacentes há muitos equipamentos culturais, porém esses não possuem um espaço físico suficiente e adequado para realização dessas atividades, como é o caso do Maracatu Nação Raízes de Pai Adão que possui o título de Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil e tem uma sede onde há uma grande diversidade de atividades culturais e sociais, além de debates sobre a preservação das tradições orais e ancestrais ligadas às religiões afrobrasileiras, especialmente o Candomblé, no combate ao preconceito, redução da desigualdade social e intolerância religiosa.

A conexão entre os equipamentos compõe uma rota cultural que foi abordada e utilizada para fomentar a cultura no bairro. A valorização desse percurso gera um convite as pessoas que transitam pela área a caminhar pela rota, conhecer um pouco sobre a cultura do bairro e se apropriar do lugar. Para que o espaço do pedestre seja determinante e que modais não poluentes, como a bicicleta, também sejam favorecidos, a proposta foi a implementação de uma rua compartilhada entre os equipamentos. A rota é composta por um extenso jardim, contendo árvores, ervas e canteiros que tornam-se espaços de permanência. O uso dessa vegetação é empregado afim de proteger o caráter da religião, visto que a relação do Candomblé com a natureza é muito forte. As plantas são fonte de axé, essência dos orixás, e com a crescente urbanização ficou mais raro a presença do mato nas cidades e as comunidades de terreiro encontram-se mais limitados em seu contato com as áreas verdes, além de gerar conforto térmico aos transeuntes proporcionado pelas sombras das árvores.

O programa foi estabelecido de acordo com atividades realizadas e as necessidades da Sede do Maracatu Raízes de Pai Adão, visto que foi identificado que os espaços eram pequenos e inapropriados para realização das atividades de vários grupos culturais que utilizam o espaço. No térreo há um memorial, espaço que contará a história do bairro e da forte presença da cultura negra que há nele, além da exposição de fantasias, e instrumentos musicais. A circulação vertical fica dentro do memorial e foi usada para representar e interpretar o culto no Candomblé, uma escada helicoidal com um pilar central representa o movimento circular que são realizados em torno do axé, que em alguns barracões são representados por um poste central. A caixa de escada na coberta é de vidro opaco, dessa forma a luz incide no vidro e penetra de forma tênue dentro do edifício, esse elemento irá proporcionar três efeitos de luz diferentes de acordo com Plummer. O primeiro é o Silêncio Ambiental, pois por transmitir uma sensação de placidez trará a relação com o divino, fará a ligação entre o céu, o Orum e a terra, o Aiê. O segundo efeito é o de Procissão visto que a luz vai indicar ao visitante o caminho a ser percorrido para chegar ao ''céu'', além de ser um atrativo plástico, e o terceiro efeito é o de Véus de Cristal, pois a luz que passa pelas lâminas de vidro, que se refrata na película, impede a passagem direta da mesma dentro do edifício. Dessa forma, ao chegar na coberta, o visitante sairá da caixa de escada e irá se deparar com uma ''explosão'' de luz ao sair da caixa de vidro que completará a ligação entre o céu e terra, a coberta terá como uso uma horta urbana com uma diversidade de ervas, representando a presença e o contato com os orixás, uma vez que a natureza é a essência das divindades africanas.

O objetivo da horta urbana é valorizar as comunidades de terreiro que estão cada vez mais limitados em seu contato com as áreas verdes, assim, não precisaram se deslocar para sítios afastados para colher as ervas. No primeiro pavimento estão a biblioteca, sala de multimídia, administração e oficina, espaço onde serão confeccionados instrumentos, fantasias, acessórios e artefatos. A oficina fica acima do espaço de expressão corporal, sob os dois ambientes há uma iluminação zenital que ascende para o céu, as duas aberturas das lajes foram ligadas por um tronco de cone composto por lâminas de vidros foscos coloridos, onde na oficina esses vidros irão refletir um arco-íris, as cores representam a diversidade. No térreo essa iluminação zenital provocará o efeito de luz da Evanescência, a luz ao incidir no chão ficará transitando durante o espaço durante todo o dia e tem como finalidade representar o axé que em alguns barracões são representados por uma demarcação no piso. A fachada é constituída por controladores de luz, brises fixos horizontais, atirantados, por toda sua extensão arranjados em uma configuração linear que se tornam jardim vertical permitindo que o mesmo se estenda por toda a fachada, o que irá auxiliar também no resfriamento passivo do edifício. Ocasionalmente os brises irão até o piso e funcionarão como septos, próximo aos banheiros e depósitos, e como bancos, próximo a quadra e espaço de expressão corporal.

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